Educação emocional é coisa séria!
Facebook Twitter Google+ Educação Emocional: “Cérebros brilhantes também podem produzir grandes sofrimentos. É...
Todos nós, direta ou indiretamente, somos influenciados pelos padrões de beleza. Vivemos com uma sombra pesada de “bonitões” e bonitonas” nos quais deveríamos nos espelhar. E mesmo com a chuva de livros e palestras de autoajuda dos últimos anos, sempre aconselhando as pessoas a não ligar para os padrões midiáticos, a se amar mais e gostar mais de si mesmas, milhões de adultos seguem inseguros em relação a sua beleza e aparência física.
O padrão de beleza todos conhecem. Está nas capas das revistas, nas novelas, nos filmes, nas séries, no instagram. Este último até fez surgir um novo tipo de celebridade: os saradões e saradonas do insta. Gente que é famosa porque tem um “corpo perfeito”. O sentimento de muitos ao se olharem no espelho depois de uma espiada no insta dessas pessoas costuma ser o de vergonha do próprio corpo. Como se tivessem um “corpo imperfeito”. Feio.
Agora imagine, se é difícil para os adultos lidarem com isso, imagine como deve ser para nossas crianças e adolescentes.
A pressão sobre as meninas começa ainda na infância. Meninas querem ser princesas. Princesas estas que invariavelmente são muito magras, cinturinha de pilão. As protagonistas mirins de novelas e filmes também seguem a mesma linha, sempre magras como barbies. Com a chegada da adolescência a coisa piora e muito, musas teens, modelos, atrizes e meninas do instagram com suas barrigas negativas só aumentam a distância da maioria das nossas meninas de serem consideradas bonitas para a mídia do corpo perfeito. O resultado, uma geração de meninas que se acham feias, insatisfeitas com o próprio corpo.
E engana-se quem pensa que para meninos não haja pressão pelo corpo perfeito. Tal pressão costuma ser menor que a sentida pelas meninas, mas também faz seus estragos nos garotos. Os atores Zac Efron e Taylor Lautner, por exemplo, são modelos recentes de adolescentes perfeitos do cinema. Em seus filmes de maior sucesso, ambos são jovens na casa dos 16 anos, com barriga tanquinho e físico de Van Damme, tipo boneco do Comandos em Ação. Claro que as meninas suspiram. Já os meninos, depois de assisti-los, se olham no espelho e se acham feios.
Não é à toa que tantos adolescentes hoje em dia pedem para que seus pais os matriculem em academias. O que a princípio até parece um pedido legal, vendo pelo lado da saúde. Só que muitas vezes esse pedido esconde a real motivação, o desejo pelo “corpo perfeito”.
Infelizmente a cultura fitness, tão em voga atualmente, legitimou uma ditadura do corpo perfeito. Mas não pense que isso é algo novo, da geração instagram. Essa ditadura do corpo perfeito na mídia já vem se instaurando há décadas no mundo todo. No Brasil, a influência sobre os mais jovens, começa com os surfistas sarados Juba e Lula de Armação Ilimitada nos anos 80, e se estabelece nos anos 90 com a novelinha infinita “Malhação” (há mais de 20 anos no ar). Os protagonistas, o mocinho e a mocinha, de Malhação sempre são meninos e meninas atléticos, “perfeitos”.
A autoestima está diretamente relacionada a como lidamos com as nossas emoções. Segundo o neurocientista Donald Stuss, da Universidade de Toronto, no Canadá, estudos mostram que a partir dos 11 anos a frequência de sentimentos tidos como positivos tendem a diminuir conforme a puberdade apresenta novos conflitos. Ou seja, as emoções como alegria são predominantes na cabeça das crianças. Com a chegada da adolescência, a criança passa a ser mais suscetível a outras emoções como tristeza e raiva, por exemplo. A ebulição de hormônios também não ajuda. Adolescentes podem sentir as emoções negativas até três vezes mais do que quando eram crianças.
Junte a isso a montanha russa das mudanças de humor repentinas e você tem o que muitos pais chamam de “aborrescente”. Só que chamá-los assim não ajuda. Melhor entender que estamos diante de um ser humano com dificuldades para equilibrar as emoções dentro de si.
Essas mudanças emocionais tornam o adolescente mais vulnerável para a opinião dos outros e claro, da mídia. Opiniões de terceiros sobre eles realmente os atingem. Inseguros, querem ser aceitos. Os discursos de autoajuda não colam com eles. Adolescentes não querem ser autênticos, eles querem a certeza de que serão aceitos e notados. Por isso as celebridades os seduzem tanto. Muitos acreditam piamente que se parecer com uma celebridade, alcançar um corpo perfeito, pode resolver os problemas da adolescência.
“A cultura do corpo perfeito não é a cultura da saúde, como a mídia propaga. Quando se elege um ‘corpo perfeito’ como modelo, isso já é um caminho para o comportamento obsessivo”, explicou a psicóloga Lauren Moreaux em entrevista ao Pais em Apuros.
Questionada sobre os riscos da busca pelo corpo perfeito no tocante aos adolescentes, a psicóloga Lauren Moreaux alerta: “O adolescente vive sob a contradição de ser considerado socialmente imaturo apesar da maturidade corporal. A maneira como trata seu corpo é intimamente relacionada com o ideal de adulto que pretende ser. Como se, moldando o próprio corpo, tivesse controle sobre o seu destino. Só que tem um detalhe: o adolescente tem pressa, quer aqui e agora. Então pode se submeter a recursos nada saudáveis para obter o corpo que deseja. Provavelmente, o adolescente não vai conseguir moldar o seu corpo de maneira a se sentir satisfeito, principalmente porque não é do corpo que se trata: trata-se de seu projeto de vida e adequação social”.
Sobre os riscos à saúde, Lauren também alertou: “Assim, com a justificativa de busca da saúde, cria-se um sistema fechado de conquista do inatingível. Criando situações de distorção da imagem corporal, adoção de dietas ferozes, com risco de transtornos alimentares (bulimia, anorexia e vigorexia), uso abusivo de hormônios, anabolizantes e diversas outras drogas. E há de se considerar também uma maior propensão a quadros de depressão”.
Essa reportagem não é um manifesto contra as academias ou profissionais de educação física. Pelo contrário. É um manifesto pela boa educação física. Aquela voltada para a saúde, não exclusivamente para a aparência.
“Na contramão dessa cultura do corpo perfeito, já existem academias nas quais não há espelhos, como algumas do SESC SP, por exemplo. Um dos motivos disso é resgatar a musculação como atividade física voltada para a boa saúde”, defende João Gambini, profissional de educação física e idealizador do Pais em Apuros.
O educador físico e atleta Carlos Cristóvão faz coro com o fundador do Pais em Apuros, “As pessoas precisam entender que muita aparência pode ser uma imagem falsa. Um corpo muito definido pode ser um corpo anabolizado. Os jovens têm que se preocupar primeiro com a saúde. A melhor forma para ter um corpo perfeito e saudável é treinar de forma correta e bem orientada por um profissional, ter hábitos alimentares mais saudáveis, também orientados por um profissional da área, e levar a vida da maneira mais saudável possível. O que, claro, pede muita paciência, dedicação, foco, bem como abrir a mão de muitas coisas que os jovens gostam de fazer”.
Eis o drama, os adolescentes ligam para a opinião dos colegas e da sociedade. A opinião destes é clara: existe um padrão de corpo perfeito. E quanto mais distante do padrão, mais deslocado é o jovem. Bullying e baixa autoestima por causa da aparência são uma realidade de inúmeras crianças e adolescentes. Ok! “Mas como eu faço para proteger meu filho?”.
A resposta é criar uma criança e um adolescente confiante. Mas não um serumaninho metido, que se ache, a ideia é reforçar sempre o quão bonito e bacana o seu filho ou filha é. E quando eu digo sempre é sempre mesmo. Lembre-se, adolescentes sentem até três vezes mais emoções negativas como críticas. Eles precisam ter um bom lastro de elogios no inconsciente. Dizer que o (a) adolescente é bonito(a), contar e lembrá-los(as) sempre sobre outras pessoas (principalmente da idade deles) que também os acham bonitos é sempre uma boa. A receita é batida, mas funciona: o bom e velho amor de família.
Outra alternativa também é seguir o conselho da psicóloga Lauren Moreaux:
“Uma pesquisa inglesa feita em 1995 na Universidade de Edinburgh, acompanhou pessoas fora dos padrões estéticos e comportamentais por uma década. A conclusão pode ser um lampejo no fim do túnel: pessoas fora dos padrões se mostraram mais seguras, menos estressadas e mais felizes. O que mostra que a solução começa em nós mesmos: vivendo harmoniosamente com o corpo que temos. Que tal tentar?”
“Isso de querer ser exatamente aquilo que a gente é ainda vai nos levar além” – Paulo Leminski.
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*Por Gilmar Silva e Rafaella Teixeira
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